O artigo 34 da Lei 11.343/2006, que pune a posse de equipamentos para a fabricação de entorpecentes, está vinculado ao narcotráfico, e não pode ser aplicado contra quem possui utensílios usados no cultivo de plantas destinadas à produção de pequena quantidade de droga para uso pessoal.
Com esse entendimento, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) determinou o trancamento parcial da ação penal contra um homem
denunciado por possuir instrumentos usados no plantio de maconha e na
extração de óleo de haxixe. Ele continuará a responder apenas pela posse
de drogas para consumo próprio (artigo 28 da Lei de Drogas), pois tinha
em depósito 5,8g de haxixe e oito plantas de maconha.
A ministra Laurita Vaz, relatora do recurso em habeas corpus,
explicou que o artigo 34 da lei tem o objetivo de punir os atos
preparatórios para o tráfico de drogas (descrito no artigo 33). Em
consequência, o crime do artigo 34 é absorvido pelo do artigo 33 quando
as ações são praticadas no mesmo contexto, mas, segundo a ministra, ele
também pode se configurar de forma autônoma, desde que fique provado que
os equipamentos em poder do réu se destinavam a produzir drogas para o
tráfico, representando risco para a saúde pública.
MP não denunciou o réu por tráfico
No caso em julgamento, porém, a relatora apontou que o próprio
Ministério Público entendeu que os entorpecentes encontrados no local se
destinavam ao consumo pessoal – tanto que o réu foi denunciado pelo
artigo 28, e não pelo 33.
Em seu voto, a ministra ainda ressaltou que o réu apresentou receita
médica estrangeira com a prescrição de uso do óleo da maconha. Ainda
que essa prescrição não torne lícita a conduta de cultivar a planta e
extrair o óleo no Brasil, ela comentou que tal circunstância reforça a
conclusão de que os instrumentos realmente se destinavam à produção para
uso próprio.
Para Laurita Vaz, embora o delito do artigo 34 da Lei de Drogas
possa subsistir de forma autônoma, não é possível que o agente responda
por esse crime se a posse dos instrumentos constitui ato preparatório
destinado ao consumo pessoal de entorpecente, e não ao tráfico. A
ministra destacou que o artigo 28 prevê tratamento mais brando para quem
é usuário (advertência, prestação de serviços ou comparecimento a
programa educativo), não se justificando punir com mais rigor as ações
que antecedem o consumo pessoal.
"Se a própria legislação reconhece o menor potencial ofensivo da
conduta do usuário que adquire drogas diretamente no mercado espúrio de
entorpecentes, não há como evadir-se à conclusão de que também se
encontra em situação de baixa periculosidade o agente que sequer
fomentou o tráfico, haja vista ter cultivado pessoalmente a própria
planta destinada à extração do óleo, para seu exclusivo consumo",
afirmou.
Risco de um contrassenso jurídico
A ministra observou também que o parágrafo 1º do artigo 28 da Lei de
Drogas manda aplicar as mesmas penalidades mais brandas a quem semeia,
cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade
de droga para uso pessoal.
"Logo, considerando que as penas do artigo 28 da Lei de Drogas
também são aplicadas para quem cultiva a planta destinada ao preparo de
pequena quantidade de substância ou produto (óleo), seria um
contrassenso jurídico que a posse de objetos destinados ao cultivo de
planta psicotrópica, para uso pessoal, viesse a caracterizar um crime
muito mais grave, equiparado a hediondo e punido com pena privativa de
liberdade de três a dez anos de reclusão, além do pagamento de vultosa
multa", disse a ministra.
Para a magistrada, quem cultiva uma planta, naturalmente, faz uso de
ferramentas típicas de plantio, "razão pela qual se deve concluir que a
posse de tais objetos está abrangida pela conduta típica prevista no
parágrafo 1º do artigo 28 da Lei 11.343/2006 e, portanto, não é capaz de
configurar delito autônomo".
RHC135617
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